terça-feira, 6 de novembro de 2007

Glórias dos sistemas de saúde europeus


Sicko, em exibição em duas salas de Portugal (isto é, Lisboa: Amoreiras e Nimas), mostra que Michael Moore (MM) não perdeu o jeito. Mas ironicamente também poderá ser o trabalho que vai deixar mais desconfiados os seus fans. Principalmente aqueles que se habituaram a pensar que ele faz documentários. E que os faz com isenção e imparcialidade. Não são tão poucos como isso.

MM mostra algumas situações incríveis que acontecem no sistema de saúde norte-americano. Um sistema em que o Estado se demitiu das suas responsabilidades e é estrangulado pelos interesses de privados: seguradoras e empresas farmacêuticas. E onde 50 milhões não tem direito a um seguro de saúde. E mesmo aqueles que têm não podem ficar descansados.

Num dos casos apresentados, uma pessoa sofre um acidente, fica com dois dedos cortados e é-lhe dado a escolher entre colocar um por 12 mil dólares e outro por 60 mil. Perante este e outros episódios, dificilmente não ficamos a pensar que algo está muito errado com aquele sistema e aquelas "propostas". Mesmo sendo muito provável que MM não nos esteja a contar a história toda.

O caso muda de figura quando MM quer comprovar que os Estados Unidos têm mesmo um péssimo sistema. Sobe ao Canadá e é tudo uma maravilha: as pessoas são logo atendidas e ninguém lhes pergunta se têm dinheiro para pagar os tratamentos. Até aqui tudo bem, pode ser que seja mesmo assim. O pior é depois, quando MM atravessa o oceano e vem saber como são tratados os cidadãos europeus, acabando a pintar um cenário cor-de-rosa dos sistemas nacionais de saúde da Grã-Bretanha e de França. Que são geridos pelo Estado.

Mesmo com níveis de desenvolvimento diferentes, basta ver os noticiários estrangeiros disponíveis no cabo ou satélite, os jornais ou a Internet, para ver que MM está mesmo a fazer ficção. Não é preciso conhecer os sistemas destes países. Toda a gente já teve que lidar com um sistema de saúde "tendencionalmente gratuito" gerido pelo Estado. Portugal também tem o seu e sabemos como funciona.

Vendo Sicko, tudo parece melhor do que o modelo que existe nos EUA. Mas os espectadores europeus vão sentir algum desconforto. Alguns podem mesmo achar que esta manipulação de Moore para demonstrar os seus pontos de vista é ir um pouco longe demais. E a oportunidade de rir novamente à custa de George W. Bush pode não ser suficiente para esquecer isso.

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