segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Um "Film Festival" no Estoril

Quando foram conhecidos os pormenores concretos do European Film Festival Estoril '07, fiquei com a impressão que os responsáveis estavam a fazer do Festival uma espécie de Tavares Rico. Ou seja, se a pessoa tem dinheiro, vai ao restaurante com frequência e encara uma série de questões de forma relaxada. Mas se não for o caso, só lá vai para festejar os 25 anos de casamento.

As questões em que estou a pensar surgiram por causa da estratégia do festival. A própria localização do certame foi subestimada. Perguntaram ao Paulo Branco, o director, se achava que as pessoas iriam ao Estoril. Resposta: de comboio, são 15 minutos de Lisboa até lá.
Parece tão simples, mas claramente ele não tem noção de como vivem os comuns mortais. Não são 15 minutos, mas ainda que fossem, falta acrescentar o tempo que se gasta até chegar ao Cais do Sodré e, mais importante, o preço dos transportes, ainda mais caro para quem não tem passes. Quem for de carro, tem de pensar no trânsito, no combustível e no parque de estacionamento pago. Ou então procurar um lugar para estacionar (boa sorte!) e arriscar andar um bocadinho a pé. E sou generoso ao não partir do princípio que o potencial espectador vai comer alguma coisa na zona ou pagar a babysitters.

É capaz de ser pedir muito a quem já sai cansado do seu emprego ou a jovens estudantes com tempo livre, mas mobilidade e orçamento limitados.

Perante as questões anteriores, a programação e o preço dos bilhetes podiam ser factores decisivos. No primeiro caso, nada a dizer: Paulo Branco claramente fez valer os seus contactos e há muita coisa para descobrir e recordar. Mas no resto foram só tiros no pé. Por exemplo, no início da semana passada, quem entrasse em contacto com a organização descobria que só podia comprar bilhetes para os filmes que queria na véspera das sessões. Na quarta-feira isto já tinha mudado, mas entretanto quantos já tinham desistido? Faz algum sentido criar esta dificuldade? É assim que querem que as pessoas do centro de Lisboa e arredores apareçam vários vezes? E por que razão não se podem reservar/comprar bilhetes pela Internet?

Além disso, estamos no primeiro ano. Deviam existir pacotes com desconto e outras soluções para cativar os potenciais espectadores, cinéfilos e curiosos, criar hábitos. Algo como aconteceu este fim-de-semana, em que se oferecia um bilhete na compra de outro para as sessões no Casino do Estoril aos estudantes e detentores do cartão Medeia... só que isto foi divulgado no sábado, o que dá a ideia que é já uma forma de corrigir uma estratégia arrogante que existia antes de começarem a vender bilhetes e descobrirem que, afinal, faltam espectadores.

Mas o pior é mesmo o preço dos bilhetes. Seis euros para as sessões no Casino e quatro nas salas do CascaisVilla. O que estavam a pensar? É assim que se projectam os filmes e o próprio festival?

Quem vai ver numa sala de cinema filmes com 20-30 anos de Almodóvar, Coppola, De Palma ou Lynch? Os cinéfilos e alguns curiosos. Nos tempos que correm, será razoável pedir-lhes quatro euros para ver o que já conhecem de trás para a frente e provavelmente têm em VHS ou DVD? E os obscuros filmes em competição? Quem vai a festivais sabe que tanto pode apanhar preciosidades como coisas muito fraquinhas. Um festival devia ser uma festa, um ponto de confluência de pessoas e cinefilia: bilhetes a quatro euros e sem descontos é estar a pedir mesmo aos mais entusiastas para fazer opções. Assim, que balanço pode uma pessoa fazer de um festival que pretende voltar para o ano?

E o que posso dizer das outras propostas no Casino a seis euros? Que por esta quantia espero ter a possibilidade de brincar nas slot machines.

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